domingo, 14 de setembro de 2008

RESENHA ANALÍTICA DO LIVRO MENINAS DA NOITE


Trabalho apresentado para a disciplina de Sociologia

Autor: Leandro Aparecido Tonietti

O livro “Meninas da Noite” de Gilberto Dimenstein é uma série de reportagens sobre a prostituição de meninas consideradas escrava da região norte e nordeste do Brasil que foram publicadas no jornal Folha de S. Paulo, em 1992. É justamente a cobertura de prostituição infantil feita pela Folha, entre 1985 e 1995. Um trabalho amplo que durou um ano entre planejamento, investigação e publicação das matérias. O autor viajou durante seis meses pelo Norte e Nordeste do Brasil, procurando lugares onde meninas eram escravizadas sexualmente ou quase mantidas em cativeiro.
Segundo Gilberto Dimenstein, um dos estímulos à prostituição é a própria família: "A garota trabalha, em geral, de vendedora de chiclete ou bala. Mas é obrigada a levar uma determinada quantia para casa, sob pena de apanhar. Sem dinheiro, às vezes ela se entrega aos homens para voltar para casa com a quantia exigida. O furto é alternativo, porém mais arriscada."Com bastante propriedade, o autor usa a expressão meninas-escravas, visto que se trata de um mercado de gente. Ou como o autor descreve: "Convido o leitor a dividir comigo essa viagem pelas rotas do tráfico humano..." (p. 11). Ou seja, o que acontece nesse submundo da sociedade é tão-somente uma caricatura do que acontece em todos os outros planos: a mercantilização humana. A prostituição infantil é algo que preocupa todas as cidades do mundo. Uma realidade preocupante e verdadeira. Gilberto Dimenstein coloca isso em tese neste livro. Todas as meninas relatadas em nesta obra têm problemas com os familiares, algumas nem possuem pais ou familiares, não tendo ao menos onde morar. O livro também mostra que há uma escravidão em todo esse meio. As meninas têm lugar pra morar e tem que pagar por tudo que elas consomem, desde comida até perfumes e roupas. Elas sempre ficam com dívidas quase eternas, nunca podendo sair da prostituição. Há casos também de meninas virgens sendo leiloadas. A virgindade é algo que os homens querem como mérito nesses locais. Eles fazem leilões para ver quem dá mais pelas meninas virgens, e o comprador que der o valor mais alto tira virgindade da menina. Várias dessas crianças são chamadas para trabalhar em empregos formais como garçonetes, faxineiras etc., mas essa promessa é totalmente falsa. Quando as meninas chegam ao local, são levadas imediatamente para a prostituição infantil. As que negam em se prostituir são perseguidas, torturadas, e as meninas que tentam fugir da casa de prostituição maioria das vezes são mortas até pelos próprios policiais da região.
Gilberto Dimenstein aborda, também, a prostituição na área indígena que, segundo o líder Antônio Apurinã, de Rio Branco, Acre, é alarmante.O autor nos faz refletir sobre a condição sub-humana em que vivem as meninas, morando em cativeiro e sendo traficadas para se prostituírem. Revelou que muitas meninas de classe média acabam vendendo seu próprio corpo para comprar uma calça de marca. No percurso, perdem-se nas drogas e nas doenças e entram para o submundo, geralmente num caminho sem volta. No final do livro Gilberto Dimenstein consegue denunciar todos esses abusos para a polícia que acabaram prendendo o maior cafetão da região. As meninas foram libertadas e receberam cuidados médicos que necessitavam. Mas não há dúvida que a maioria delas irão voltar para a prostituição, pois é a única fonte de sobrevivência que elas possuem.
Analisando os aspectos do livro que as meninas que caem na prostituição são na maioria das vezes, meninas que passaram por algum estupro na infância, por pais, parentes, ou alguém desconhecido, como no caso da Maria Aparecida da Silva que trocou sua virgindade pelo sonho de ter uma boneca que nunca foi dada a ela. As garotas que vivem nesses locais são expostas a doenças, muita falta de higiene e se submetem os abortos precários.
Observamos assim que a falta de estrutura familiar é uma das causas que mais contribuem para a prostituição e colocam em foco fatores socioeconômicos e psicológicos.
As mulheres prostituías, em sua maioria foram, foram condicionadas para ser prostitutas através dos maus tratos, da violência, da discriminação e da falta de auto-estima, que as faz vulneráveis e passivas. Dentro desses condicionamentos, as mulheres sentem que não valem nada em si e que seu único recurso é o uso do seu corpo como objeto sexual.
Fatores econômicos como a falta de emprego, migração para os grandes centros urbanos, jovens do campo passando a viver na cidade, mães solteiras com dificuldade na manutenção do filho. Moradias em condições subumanas como: barracos, cortiços, porões, muitas vezes abrigam a promiscuidade, que é um caminho aberto para a prostituição.
Fatores psicológicos como as carências afetivas, e traumas que marcam a infância e a adolescência das pessoas. Tem-se observado, na convivência com as mulheres prostituídas nas situações de pobreza, que na maioria foi estuprada na infância por alguém muito próximo, possui baixa ou nenhuma escolaridade e faltou-lhes apoio familiar. Quanto às mais jovens trocam o corpo por uma quantia de droga ilícita.
Há uma legião de meninas vendendo o corpo por desinformarão e ilusão, levadas pela ganância de agenciadores, e pela mídia. Que querem ganhar dinheiro, com baixa escolaridade e sem empregos a vista. Enxergam, no sexo comercializado, a única porta para as maravilhas do consumo, o ideal moderno da felicidade.
Um grande número delas sofreu violência sexual por parte de familiares, pessoas próximas ou nos locais onde trabalhavam como doméstica.
Iniciaram a prostituição na puberdade e na adolescência, provocando distúrbios no seu comportamento afetivo-emocional e obstáculos no aprendizado fundamental básico, ou seja, são em sua maioria analfabetas ou semi-analfabetas. São rejeitadas socialmente pela atividade de prostituição e assimilam de forma profunda os preconceitos e a desvalorização social, fatores que agravam as dificuldades de procura e de entrada no mercado de trabalho. Em situação de abandono, são submetidas e exploradas por mulheres e homens que vivem da prostituição os chamados cafetões e também de traficantes de drogas. Envolvidas nessas situações são constantemente presas e vitimas de abusos e violência policial.
Das 53 meninas e adolescentes prostitutas entrevistadas no livro, nada menos que 95% vêm de famílias desestruturadas, 80% não tem contato com o pai, os pais de 30% das entrevistadas estão mortos, 35% admitem que sofreram tentativas de abuso sexual em casa, apontando o padrasto como o principal responsável diante de uma mãe passiva, 50% apontam a bebida como um problema familiar
Diante das porcentagens podemos descrever para ilustrar dois relatos de jovens em Belém:
“Quando estou com fome, vou a um restaurante e peço comida para o garçom. E digo que vou pagar com uma chupetinha (sexo oral) faço o que tenho que fazer e ganho minha refeição”.
“... queria muito um a calça que tinha visto na vitrine, mas não tinha dinheiro para comprar o moço da loja percebeu e eu troquei minha virgindade pela calça”.
Os dois fatos tratam da barganha de um objeto ou alimento pela atividade sexual, sendo que a refeição trata-se de uma questão de sobrevivência, mas ao querer adquirir uma calça pode-se enfrentar como um capricho, ou vontade de adquirir aquilo que de nenhuma forma se pode.
Há também casos em que as mães se aproveitam da situação de prostituição da filha e quando elas querem sair ou saem dessa vida, as mães não aceitam, pois suas filhas assim param de trazer renda para suas casas, como o caso de Ana Paula que trabalhava grávida no prostíbulo da mãe.
Essa trajetória violenta trás muitas conseqüências em suas vidas, para elas é extremamente complexo enfrentar a forte marca que recebem por estar e freqüentar a rua, por seus comportamentos, vão descobrindo um mundo surrealista e sem privilégios sociais, cheios de subornos, violência psicológica e marcas da violência física, a falta de perspectiva, de qualificação, de conhecimento de outra vida, acabam lhe causando depressão que leva algumas a pensar em suicídio desde de que começaram a se prostituir.
Encontramos no livro também os lugares onde essa exploração sexual é mais freqüente, os garimpos, por exemplo, propiciam as formas mais violentas de exploração sexual que incluem cárcere privado, venda e trafico de crianças e adolescentes, leilões de meninas virgens, mutilações, desaparecimento e turismo sexual portuário e de fronteiras.
A exploração em prostíbulos também é citada no livro, nas regiões da fronteira e da rota de narcóticos, com redes de prostíbulos fechados e leilões de virgens.
E talvez o mais comum e preocupante que é o turismo sexual, com uma rede organizada de aliciamento que inclui agencias de turismo nacionais e internacionais, hotéis, taxistas e comercio de pornografia, trafico de menores para países estrangeiros. Fenômeno recente na região é a descentralização da exploração de menores que começa a se deslocar do litoral para o sertão.
Observamos que essas rotas de tráficos de meninas convertidas em prostitutas é um sinal cristalino da desorganização e desumanidade desse movimento.
Apesar de o Nordeste ocupar o primeiro lugar na rota de trafico sexual no Brasil com 289 municípios, podemos observar também que a região Sudeste vem em segundo lugar com 241 municípios e a região Sul em terceiro com 162 municípios, segundo a pesquisa realizada pela Unicef e Pela a universidade de Brasília, entre as cidades apontadas 93 estão dentro do Estado de São Paulo, assim percebemos que o problema da exploração sexual no Brasil está mais próximo da nossa realidade do que podemos as vezes perceber.
Podemos fazer um paralelo do livro com dois artigos da socióloga “Afife Salim Sarquis Fazzano”, “Quando Berço é a Rua” e “Sociedade; Produção: Miséria”, onde ela faz uma analise da marginalização, da vida de miséria de crianças e adolescentes que vivem nas ruas sem nenhum apoio governamental, mostrando ainda os contrastes da vida dessas pessoas com a da leite, mostrando assim como é desigual a situação em nosso país, e acabamos por perceber que a vida desses marginalizados não é muito diferente da vida que dessas meninas citadas no livro de Dimenstein.
O livro trabalhado tem o papel informativo e de mudança social, tanto como denuncia do fato a sociedade e também, no mais intimo de nosso pensamento influenciar como medida de mudança sócia cultural, para que não fiquemos inertes a tal situação injusta e desprezível, que façamos algo contra essa pratica absurda e demonstremos nossa inquietação e indignação, e que não fique só na leitura do livro, mas que ele nos de força para fazer algo para mudar tudo que está acontecendo ao nosso redor e que às vezes fechamos os olhos para essa realidade tão injusta e cruel.
Podemos concluir com esse trabalho que a exploração social é um grave atentado aos direitos das crianças e dos adolescentes. Ela se caracteriza pelo uso sexual com fins de lucro, seja levando-os para manter relações sexuais com adultos ou adolescentes mais velhos, sejam utilizando para a produção de materiais pornográficos, como revistas, fotografias, filmes, vídeos e sites na internet e principalmente quando há o trafico dessas pessoas que são levados para outros países com promessas de empregos e acabam tendo que vender o próprio corpo para sobreviver.
Considerar que a prostituição é uma opção de trabalho é considerar que o corpo da mulher e dos menores de idade é uma mercadoria. Essas pessoas são os filhos da promiscuidade gerados pela miséria, pela desigualdade nesse país, pela droga, pela violência sexual infantil e principalmente pelo descaso de nossos governantes que faz pouco para mudar essa realidade, não devemos seguir esse exemplo, não podemos cruzar os braços, temos que denunciar todo tipo de violência sexual ou não, se cada um fizer sua parte podemos fazer a diferença.

Bibliografia:

DIMENSTEIN, Gilberto, 1992. Meninas da Noite. São Paulo, Editora Ática.
FAZZANO, Afife Salim Sarquis, 2007. Sociedade; Produção: Miséria.
FAZZANO, Afife Salim Sarquis, 2007. Quando o Berço é a Rua: uma analise da desigualdade social, sua repercussão no desenvolvimento pessoal e as possibilidades de reintegração social.
LOPES, Tielli, 2008. Rotas do da Exploração sexual infantil no Brasil. http://tielli.blogspot.com/2008/01/explorao-sexual-infantil.html











sábado, 13 de setembro de 2008

A TV DIGITAL E A INTEGRAÇÃO DAS TECNOLOIAS NA EDUCAÇÃO

José Manuel Moran
Professor de novas tecnologias na USP. Diretor Acadêmico da Faculdade Sumaré-SP.
Texto publicado no boletim 23 sobre Mídias Digitais do Programa Salto para o Futuro. TV Escola - SEED, novembro, 2007.
Disponível em: http://www.tvebrasil.com.br/salto/boletins2007/md/index.htm

Introdução
Estamos caminhando para uma nova fase de convergência e integração das mídias: Tudo começa a integrar-se com tudo, a falar com tudo e com todos. Tudo pode ser divulgado em alguma mídia. Todos podem ser produtores e consumidores de informação.
A digitalização permite registrar, editar, combinar, manipular toda e qualquer informação, por qualquer meio, em qualquer lugar, a qualquer tempo. A digitalização traz a multiplicação de possibilidades de escolha, de interação. A mobilidade e a virtualização nos libertam dos espaços e tempos rígidos, previsíveis, determinados. O mundo físico se reproduz em plataformas digitais e todos os serviços começam a poder ser realizados física ou virtualmente. Podemos pagar contas numa agência de banco ou na Internet, fazer compras numa loja ou através de lojas virtuais. Há um diálogo crescente, muito novo e rico entre o mundo físico e o chamado mundo digital, com suas múltiplas atividades de pesquisa, lazer, de relacionamento e outros serviços e possibilidades de integração entre ambos, que impactam profundamente a educação escolar e as formas de ensinar e aprender a que estamos habituados.
As mudanças que estão acontecendo na sociedade, mediadas pelas tecnologias em rede, são de tal magnitude que implicam – a médio prazo - em reinventar a educação como um todo, em todos os níveis e de todas as formas.

A TV digital e a integração das tecnologias
As tecnologias começaram e se mantiveram separadas – computador, celular, Internet, mp3, câmera digital e agora a TV – e agora caminham na direção da convergência, da integração, dos equipamentos multifuncionais que agregam valor. O computador fica cada vez mais potente e menor, ligado à internet banda larga, a redes sem fio, à câmera digital, ao celular, aos tocadores de música. O telefone celular é a tecnologia que atualmente mais agrega valor: é wireless (sem fio) e rapidamente incorporou o acesso à Internet, à foto e vídeo digitais, aos programas de comunicação (voz, TV), ao entretenimento (jogos, música-mp3) e outros serviços. A televisão é a última das grandes mídias a tornar-se digital. E agora se insere num mundo de tecnologias já digitais, já mais interativas e integradas e precisa correr atrás para recuperar o espaço perdido, principalmente o das múltiplas escolhas na hora e lugar que as pessoas assim o quiserem.
Com a chegada da TV digital a pressão pela integração tecnológica será muito maior. Infelizmente, ainda demorará a acontecer, porque estamos numa fase de transição do modelo industrial para a sociedade do conhecimento, ainda presos a modelos de empresas de telecomunicações e audiovisuais cartoriais, que defendem áreas já conquistadas, campos de atuação exclusivos e conceitos de propriedade intelectual, que precisam ser revistos com urgência.
Especificamente no Brasil, teremos a TV digital dos grandes eventos ao vivo, como Olimpíadas, passadas em alta definição, com imagem fantástica e inúmeros recursos de som. Teremos canais que transmitirão também em alta definição filmes e novelas para um público mais exigente e com maior poder aquisitivo. Teremos também na TV aberta muitos canais de TV digital de qualidade boa, mas sem ser de alta definição, que passarão noticiários vinte e quatro horas, esporte, vendas, como hoje acontece na TV por assinatura. Serão canais com alguma interação para compras, votações de opinião, etc. E teremos uma outra TV digital on-demand , a la carte , isto é escolheremos em cada momento entre um menu muito diversificado de programas prontos aqueles que nos interessam mais. Uns serão gratuitos, pagos por publicidade, e outros pagos diretamente pelo consumidor.
No começo, a TV digital oferecerá mais canais, mais oferta de conteúdo e alguma interação: escolhas básicas, simples sem muitos recursos complexos. As emissoras tentarão controlar o conteúdo ofertado, que é o mais caro e o que as pessoas mais procuram, mas haverá simultaneamente muitos grupos oferecendo formas novas de produção e divulgação desse conteúdo, ampliando o número de usuários-produtores, como começa a acontecer agora na Internet.
A rapidez da evolução dos serviços na Internet e no celular, com muitas formas de navegação, escolhas e interação obrigará à TV a ser muito mais participativa, a oferecer formas de participação mais abrangentes, a médio prazo, para não perder mercado.

Aplicações da TV digital na educação
Que conseqüências terá a passagem da TV convencional para a digital e a integração com as outras mídias na educação?.
A tecnologia digital baixa custos, a médio e longo prazo. Na educação, teremos muitos canais e recursos para acessar conteúdos digitais de cursos e realizar debates com especialistas e entre alunos. Será fácil também a orientação de pesquisas, de projetos e mostrar (apresentar, disponibilizar) os resultados. Poderemos produzir belas aulas e deixa-las disponíveis para os alunos acessa-las no ritmo que quiserem e no horário que acharem conveniente, com qualidade melhor do que a atualmente conseguida na Internet. Haverá mais realismo na interação a distância, nos programas de comunicação a distância, isto é conseguiremos, mesmo fisicamente longe, ter a sensação de estarmos juntos, de quase tocar-nos fisicamente.
Se estivermos viajando poderemos acessar um canal específico e interagir com os colegas e alunos através do celular ou de um computador portátil.
A TV digital poderá oferecer muitas mais oportunidades de os alunos serem produtores de conteúdos multimídia, como acontece hoje na Internet com o site YouTube: qualquer pessoa pode divulgar um vídeo feito com câmera digital ou celular. Os usuários avaliam o filme pela quantidade de acessos e pelo número de estrelas atribuído. Quando melhor avaliado um vídeo, mais aparece para o público ou na pesquisa do site. A tv digital pode oferecer com mais qualidade a exibição dessas produções feitas pelos usuários e acrescentar recursos de pesquisa e navegação fáceis e hiper-realistas.
Poderemos ter salas de aula abertas para cada grupo, turma, universidade e recriar nelas todo o potencial da comunicação presencial, a distância, mas conectados.

Problemas que enfrentamos com as mídias digitais
O problema do Brasil não é tecnológico, mas de desigualdade estrutural. A interatividade tem muito a ver com poder de compra, com educação de qualidade, com cultura empreendedora. A grande maioria das pessoas depende do modelo passivo de uma TV que dá tudo pronto, aparentemente de graça. Esse modelo fez sucesso. A interatividade pressupõe uma atitude de vida muito mais ativa, investigativa, inovadora.
Sem educação de qualidade, as pessoas têm menos poder de fazer crítica, de realizarem escolhas mais abrangentes. E nossa educação ainda é muito precária. A TV pode ser utilizada de forma muito rica e participativa com a digitalização e integração das mídias, mas sem uma melhoria efetiva na educação e nas condições econômicas correspondentes, a TV continuará ditando o lazer das pessoas, oferecendo mais oportunidades de concorrer a prêmios, de fazer compras - o que convenhamos não é um grande ganho em relação à TV atual.
As tecnologias digitais não atuam no vazio. Elas são utilizadas dentro de contextos educacionais diferentes. Grandes grupos educacionais privados pensam nelas para baratear custos, ganhar escala (aulas para mais alunos, por satélite, por exemplo); vêem a educação como investimento, como negócio e buscam utilizar as tecnologias digitais para conseguir o máximo lucro com a mínima despesa. De um lado introduzem modelos altamente complexos e sofisticados de tele-aulas, de ambientes virtuais com conteúdos disponibilizados e formas de avaliação comuns e simples.
São modelos para grandes grupos, para países inteiros, oferecidos de modo uniforme para todos, com algum apoio de instituições locais. São os modelos oferecidos pelas mega-universidades que estão se consolidando agora, que vêem na TV digital uma forma ideal de realizar este modelo massivo.
De outro lado teremos as instituições que oferecerão propostas educacionais mediadas pelas tecnologias digitais para grupos menores, com mais interação, focadas na aprendizagem, no aluno, em criação de grupos de pesquisa, de projetos e aprendizagem colaborativa.
Entre estes dois modelos extremos, haverá diversas formas de oferecimento de cursos semi-presenciais e a distância, todos mediados por tecnologias digitais simples e mais sofisticadas, com mais ou menos interação. Mas a mediação de tecnologias digitais daqui em diante será comum a todos, pela concorrência, necessidade de adaptação às novas formas de vida nas cidades, pela pressão para diminuir custos e atender aos alunos onde eles estiverem.
Outro fator complicador é o ritmo lento, complexo e descontínuo da gestão pública, com recursos, mas dificuldade na implementação, na continuidade das políticas, sem falar na corrupção, que diminui o impacto dos recursos na ponta, na escola.
As tecnologias dependem também de como cada um, professores, alunos e gestores as utilizam: em contextos e encontros pedagógicos motivadores ampliam a curiosidade, a motivação, a pesquisa, a interação. As tecnologias em contextos e encontros pedagógicos acomodados, rotineiros aumentam a previsibilidade, o desencanto, a banalização da aprendizagem, o desinteresse.

Conclusão
As tecnologias evoluem muito mais rapidamente do que a cultura. A cultura implica em padrões, repetição, consolidação. A cultura educacional, também. As tecnologias permitem mudanças profundas já hoje que praticamente permanecem inexploradas pela inércia da cultura tradicional, pelo medo, pelos valores consolidados. Por isso sempre haverá um distanciamento entre as possibilidades e a realidade. O ser humano avança com inúmeras contradições, muito mais devagar que os costumes, hábitos, valores. Intelectualmente também avançamos muito mais do que nas práticas. Há sempre um distanciamento grande entre o desejo e a ação. Apesar de tudo, está se construindo uma outra sociedade, que em uma ou duas décadas será muito diferente da que vivemos até agora.
Mesmo com tecnologias de ponta, ainda temos grandes dificuldades no gerenciamento emocional, tanto no pessoal como no organizacional, o que dificulta o aprendizado rápido. As mudanças na educação dependem, mais do que das novas tecnologias, de termos educadores, gestores e alunos maduros intelectual, emocional e eticamente; pessoas curiosas, interessantes, entusiasmadas, abertas e confiáveis, que saibam motivar e dialogar; pessoas com as quais valha a pena entrar em contato, porque dele sempre saímos enriquecidos. E isso não depende só de tecnologias, mas programas estruturais que valorizem os profissionais na formação e no exercício efetivo da profissão, com salários e condições dignas, onde eles se sintam importantes. As tecnologias são uma parte de um processo muito mais rico e complexo que é gostar de aprender e de ajudar a outros que aprendam numa sociedade em profunda transformação.

Referências bibliográficas do autor
MORAN, José Manuel. A educação que desejamos: novos desafios e como chegar lá . Campinas: Papirus, 2007.
___________________. Desafios na comunicação pessoal . 3ª ed. revista. São Paulo: Paulinas, 2007.
Página pessoal: http://www.eca.usp.br/prof/moran
Blog sobre educação inovadora: http://moran10.blogspot.com/

sábado, 30 de agosto de 2008


Você tem Medo de Mudar?
Estamos vivendo na era da mudança. Ter medo de mudar é o mesmo que ter medo de viver. Temos de estar flexíveis, pois tudo acontece num piscar de olhos.
Por que você e eu temos medo de mudar? Porque aquilo que já conhecemos é confortável. É mais fácil lidar com ambientes habituais, pessoas conhecidas, dialetos usuais, ditames tradicionais, tarefas costumeiras, comidas e costumes familiares. O habitual exige menos esforço. O novo requer flexibilidade e ousadia. Demanda investimento de tempo e reaprendizado. Para atingi-lo é necessário deixar a zona de conforto e questionar até mesmo aquilo que está dando certo, enfim, para desbravar é preciso ter coragem, vitalidade e energia em abundância.Cada vez mais somos instigados a cultivar a ousadia, a fibra interior, pois o mundo é feito de mudanças. Para se chegar às transformações radicais da Revolução Francesa foram necessários milhões de anos. Daí até a revolução dos computadores, foram apenas dois séculos. E para a inteligência artificial, realidade virtual e engenharia genética bastaram duas décadas. Agora, o conhecimento humano dobra a cada dois anos.Vivemos numa era de mudanças velozes e de viradas drásticas. Ter medo de mudar, hoje, significa ter medo de viver. Como tudo muda tão rápido, a transformação ocorre, com ou sem o nosso consentimento. Se o medo de mudar nos vencer, andaremos amedrontados, resistindo com unhas e dentes. Mas essa atitude não impedirá que as coisas mudem. Pelo contrário, seremos arrastados, mesmo contra a nossa vontade, por um universo em acelerado ritmo de mutação.Em vez de amaldiçoarmos a mudança, podemos abençoá-la com idéias e ações inovadoras. Ao vencermos o medo de mudar, despertamos o nosso ímpeto interior. Ao optarmos pela coragem, vivemos criativamente e enriquecemos o processo. Enfim, nos transformamos em agente de mudança: lideranças positivas. Atuamos como verdadeiros faróis marítimos, iluminando as rotas das inexoráveis transformações humanas. Então, saia da inércia e se transforme num agente de mudança!
Ömar Souki